Os homens de torso nu e calças dobradas até os joelhos pisando o cacau ainda estão lá, mas agora têm a companhia de funcionários uniformizados que espalham os grãos com mãos em luvas de borracha em cima de barcaças de metal.

E o cacau que era ensacado e enviado in natura para o exterior agora alimenta fábricas de chocolate que se espalham por cidades do sul da Bahia.

Três décadas depois da chegada da vassoura-de-bruxa, praga que dizimou lavouras e arruinou a região, o cacau da Bahia se reinventa com foco no produto de origem, cultivo sustentável e verticalização da cadeia produtiva.

O novo cenário começou a ser desenhado no início dos anos 2000, quando foram introduzidas na região mudas clonadas de variedades mais resistentes à vassoura-de-bruxa. E pode dar novos passos com o avanço das pesquisas para combater a praga.

Em abril, a equipe do professor titular da Unicamp Gonçalo Amarante publicou pesquisa sobre um novo conjunto de moléculas fungicidas capazes de combater a vassoura-de-bruxa com maior eficácia.

Com resultados promissores, a pesquisa agora demanda investimento para tornar-se um defensivo agrícola em escala industrial. Se avançar, tem potencial para fazer a região retomar o antigo patamar de produção num curto prazo.

Analisados friamente, os números mostram que o estado ainda não se recuperou do baque iniciado em 1989. Em 2018, a Bahia produziu 122,8 mil toneladas de cacau, menos de um terço das 400 mil toneladas anuais dos anos 1980, antes da vassoura-de-bruxa.

Por outro lado, a adoção do sistema de produção tipo cabruca, no qual o cacaueiro é plantado embaixo de árvores nativas da mata atlântica, e aposta na produção de frutos orgânicos elevaram o cacau baiano a um novo patamar.

Em vez de competir com os líderes globais, os produtores resolveram apostar em produtos de nicho, com maior qualidade e valor de mercado.

É o caso da fazenda Novo Oriente, em Uruçuca (41 km de Ilhéus), liderada pelo empresário Paulo Torres, 70.

A fazenda, de pequeno porte, produz 40 toneladas anuais de cacau e foca o mercado local, que oferece prêmio pela qualidade –diferença entre o preço da praça e o da Bolsa– de três a cinco vezes a cotação de Nova York.

“Nosso foco é cacau fino”, diz Torres, que entrou no negócio há dez anos. Ele divide o seu tempo entre Londres e Ilhéus.

Mercado não falta. Já são 70 as marcas de chocolate com cacau de origem na região. Algumas no segmento premium, como a Dengo, do copresidente da Natura Guilherme Leal, a AMMA, de Diego Badaró, e a Mendoá, do empresário Raimundo Mororó.

Encravada na fazenda Riachuelo, a Mendoá começou como um pequeno laboratório. Hoje, faz 300 quilos de cho- colate por dia. “A revolução já aconteceu. O desafio agora é consolidar”, diz Mororó.

A Mendoá faz do cultivo do cacau à fabricação do chocolate na própria fazenda, passando por etapas como fermentação, secagem, armazenamento e torra dos grãos. Leia mais AQUI.

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